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CRÍTICA: Assassinos da Lua das Flores e o porquê “This is Cinema”

  • Foto do escritor: Arine Figueiredo
    Arine Figueiredo
  • 8 de mar. de 2024
  • 3 min de leitura

Indicado a 10 Oscars, incluindo Melhor Filme, Melhor Direção para Scorsese, Melhor Atriz para Lily Gladstone e Melhor Ator Coadjuvante para Robert De Niro.


Imagem: Apple Studios/Divulgação


Não sabemos quem nós seríamos hoje caso a pandemia do Covid 19 nunca tivesse existido. O que somos é a junção da nossa essência com a realidade do nosso meio. Assassinos da Lua das Flores, de Martin Scorsese, também. Com o mesmo título, o livro-reportagem de David Grann é a base da poética adaptação para as telonas, que, anteriormente, teria um foco bem diferente da versão final – recalculada durante os dias de isolamento – apresentada ao público. 


Durante uma década de pesquisa, o jornalista coletou uma ampla variedade de materiais para ressuscitar a narrativa do massacre dos nativos da nação Osage em Oklahoma. O povo Osage, assim como todos os outros povos nativos dos Estados Unidos, foi expulso do seu lugar de origem por europeus cheios de armas e ganância. Em uma terra pouco fértil, o que se esperava era fome e miséria. Todavia, a descoberta de petróleo no novo lar muda a narrativa de vida dessas pessoas. 


Na década de 1920, os Osage estavam entre os povos mais ricos do mundo. Eles, inclusive, ostentavam o poder de ter empregados brancos, roupas luxuosas, carros do momento e outras diversas regalias. Entretanto, essa era de prosperidade atraiu a atenção de vigaristas e criminosos. Embora o número exato de vítimas permaneça obscuro, estima-se que pelo menos 60 pessoas - entre membros da tribo, testemunhas e investigadores - tenham morrido ou desaparecido entre 1921 e 1925.


A maré de delitos ganhou fama como o "Reinado do Terror", marcando o pioneirismo no histórico de investigações do órgão que viria a se tornar o FBI (Federal Bureau of Investigation, o equivalente a Polícia Federal dos Estados Unidos). 


Para boa parte dos leitores, Scorsese peca ao tirar o foco da investigação, do grande plot-twist – a revelação dos malfeitores e, por fim, da criação e ascensão inicial do FBI. Apesar de válidos, esses apontamentos ignoram o possível maior trunfo do longa: protagonismo indiscutível da comunidade Osage. 


Assassinos da Lua das Flores traz a história da indígena Mollie (Lily Gladstone) e seu casamento com Ernest Burkhart (Leonardo Di Caprio), sobrinho do pecuarista William Hale (Robert De Niro). Ambientada na Oklahoma da década de 20, a história é perpassada por misteriosos assassinatos. Com o passar das 3 horas e meia – que, apesar de parecerem demais, são muito bem aproveitadas – descobrimos um esquema de Hale para deter as terras da família de Mollie. 


Scorsese desnuda os indivíduos de suas vaidades e anseios, confrontando-os com a dura realidade e, por fim, com eles mesmos. A história se distancia do livro-reportagem, abordando de maneira mais direta (ainda que de forma incompleta) a construção de uma sociedade sob uma égide de corrupção e de crueldades transformadas em leis para subjugar grupos sociais considerados inferiores.


Imagem: Apple Studios/Divulgação


Com os figurinos impecáveis de Jacqueline West, a trilha sonora contida, mas eficiente, de Robbie Robertson e a fotografia impecável de Rodrigo Pietro, o espectador é presenteado com o melhor da 7º arte. Desde o momento de silêncio de Mollie e Ernest esperando a chuva passar, a proximidade que ali é criada e o sentimento confuso que compartilhamos pelo personagem de Dicaprio, ao caos de desaparecimentos, incêndios, e doenças que afligem o povo Osage. 


Vale um grande parêntese para a atuação e entrega do De Niro com o ganancioso William Hale. O personagem coadjuvante rouba a cena na última metade e deixa, em alguns momentos, o trabalho de Di Caprio uma saia justa. Hale está por trás da aproximação de Ernest e Mollie e, apesar do marido ser cruel ao medicá-la, ficamos todos confusos até o fim. Até onde foi manipulação e onde começa algo verdadeiro? 


Enquanto vemos tudo isso, a investigação fica em segundo plano. Lá pelo último terço, a tensão criada pelo enredo aumenta e chega no seu clímax. E, após o clímax, vem a derrubada. À medida que a tragédia desencadeada pela cobiça se revela durante a investigação e o julgamento posterior, a verdade subjacente é revelada.


A deterioração física de Mollie, o declínio emocional de Ernest e a decadência sociopolítica de Hale são desdobramentos individuais de algo que corroía uma comunidade ao longo de muitos anos; são manifestações de uma antiga chaga. Scorsese elabora a busca pela verdade e nos brinda com uma conquista de difícil assimilação, apresentada em um formato metalinguístico.


Assassinos da Lua das Flores tem 10 indicações ao Oscar de 2024, incluindo Melhor Filme, Melhor Direção para Scorsese, Melhor Atriz para Lily Gladstone e Melhor Ator Coadjuvante para Robert De Niro. Se fosse de apostas, diria que apenas Gladstone tem chances reais de levar para casa sua estatueta. A academia parece, desde O Irlandês, reconhecer o talento de Scorsese e a sua força para fazer trabalhos incríveis aos 81 anos de idade, mas isso não tem sido suficiente para que as estatuetas venham. 


Confira o trailer do filme logo abaixo:





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